domingo, 24 de abril de 2011

TUDO SOBRE MINHA MÃE (Todo sobre mi madre – Espanha, 1999)

Direção: Pedro Almodóvar

            Não existe dor maior para uma mãe que aquela proveniente da morte de um filho. Essa é uma verdade inexorável, experimentada por inúmeras mulheres ao redor do mundo e elas, as mulheres, são uma das grandes paixões do diretor espanhol Pedro Almodóvar. Não a mulher cristalizada em um conceito de gênero, mas aquela que pode ser experimentada como estado de espírito – em suas forças e fraquezas; em sua feminilidade liberta dos grilhões da sociedade. Tudo sobre minha mãe é uma homenagem, mais que merecida – mais que bela – a essa mulher, digamos, universalista.
            Manuela é uma enfermeira que, como presente pelo aniversário de dezessete anos de seu filho Esteban – um jovem e criativo escritor que almeja contar em uma história tudo sobre sua mãe, mas que tem dificuldades para isso, pois não consegue ela lhe fale sobre seu pai – o leva ao teatro para assistir a uma encenação de Um bonde chamado desejo. Após a peça, o rapaz convence sua mãe de esperar a atriz Huma Rojo a fim de pedir-lhe um autógrafo, mas ao tentar alcançá-la, ele acaba sendo atropelado, o que causa sua morte. É a partir da perda do filho que Manuela volta para Barcelona no intuito de encontrar o pai dele – uma travesti chamada Lola – para contar-lhe o ocorrido. Entretanto, ao chegar à cidade catalã, ela descobre que o pai de seu filho está desaparecido e passará a contar com a ajuda de Agrado – uma amiga em comum que tinha com Lola – da jovem Rosa, uma freira que auxilia pessoas necessitadas e, que, por ironia do destino, encontra-se, ela mesma, necessitada e da própria Huma Rojo que está no local encenando Um bonde chamado desejo para superar sua dor de mãe.
Questões referentes ao retorno ou à busca de elementos do passado são comuns na filmografia de Almodóvar – vide filmes como Má Educação e Volver – e, no caso de Tudo sobre minha mãe, será fundamental para desenvolver sua ação dramática. É a partir de seu retorno a Barcelona que Manuela se confronta com as dificuldades do universo feminino e é com a ajuda das pessoas as quais a cercam que ela será capaz de encontrar forças para encarar sua realidade e, também, para ajudar suas amigas – antigas ou novas. Toda essa complexa lógica de personagens é conduzida com a maestria de Almodóvar que, mais uma vez, não hesita em utilizar elementos de arte tão bem construídos em suas cores vibrantes – marca de seu cinema. Contando novamente com a parceria de Alberto Iglesias, a trilha sonora retrata as angústias vivenciadas por essas mulheres de uma forma que poderia soar exagerada nas mãos de um cineasta pouco competente – não é o caso de Almodóvar.
Outra jogada de mestre do diretor espanhol está no seu roteiro cheio de referências como a própria peça encenada e visitada em vários momentos no filme. A ligação que Manuela tem com a personagem Stela vai muito além da recordação de tê-la interpretado quando jovem; a ligação que as duas possuem está na própria constituição de Stela como uma mulher que precisa se libertar dos grilhões impostos a ela por um homem bruto. Além disso, existe a grande referência de Tudo sobre minha mãe que está no filme A Malvada cujo título original All about Eve (Tudo sobre Eve) em nada se parece com sua tradução – tanto no Brasil como na Espanha – servindo de base para o nome do filme de Almodóvar. O próprio Esteban, no início da narrativa critica essa tradução enquanto assiste à película na televisão com sua mãe, sendo que, no decorrer da história de Manuela, o filme com Bette Davis terá um papel de identificação muito importante com a protagonista de Almodóvar.
Um filme complexo, mas muito bem realizado – talvez a obra-prima de Almodóvar. Mais que uma homenagem às mulheres de todo mundo, Tudo sobre minha mãe é um incrível estudo de personagens, envolvendo questões bem atuais como a prostituição, as drogas e a aids, sobre a superação das diferenças e das mágoas em detrimento da compaixão e do respeito e, acima de tudo, sobre a maior virtude o qual, em algum grau, existe em todas as mulheres – a de ser mãe.

Um comentário:

David disse...

É o meu favorito.