Esta
semana ganhei um presentinho postado diretamente de Londres. Maninha enviou-me
um livro que me interessei em ler, mas não encontrava traduzido no Brasil.
Gritei uma palavrinha de consolo (f***-se), como bem me ensinou meu saudoso
professor de geografia do ensino médio, e assumi o desafio de lê-lo em inglês.
Comecei a leitura hoje e ela apresenta-se de forma tranquila e instigante. Não
resisti e traduzi a introdução, cujo título é Adiante*. O livro é de autoria do já falecido Professor de
Comunicação, Artes e Ciências da Universidade de Nova Iorque, Neil Postman
(1931-2003) e é intitulado Amusing
Ourselves to Death**.
Mantivemos nossos olhos em 1984. Quando o ano
chegou e a profecia não, Americanos atenciosos cantaram baixinho em louvor
próprio. As raízes da democracia liberal tinham se firmado. Onde quer que o
terror tenha acontecido, nós, ao menos, não tínhamos sido visitados pelo
pesadelo Orwelliano***.
Todavia esquecemo-nos que, juntamente com a visão
obscura de Orwell, houve outra – ligeiramente mais velha, um pouco menos
conhecida, igualmente arrepiante: Admirável
Mundo Novo de Aldous Huxley. Ao contrário do senso comum e, até mesmo, dos
mais instruídos, Huxley e Orwell não profetizaram a mesma coisa. Orwell
advertiu que seríamos dominados por uma opressão imposta externamente.
Entretanto, na visão de Huxley, nenhum Big Brother é necessário para privar as
pessoas de sua autonomia, maturidade e história. Como ele observou, as pessoas
passarão a amar sua opressão, adorar as tecnologias que desfazem suas
capacidades de pensar.
O que Orwell temia eram aqueles os quais baniriam
os livros. O que Huxley temia era o fato de que não haveria necessidade de
banir livros, pois não haveria quem quisesse lê-los. Orwell temia aqueles que
nos privariam de informação. Huxley temia aqueles que nos dariam tanta
informação que nos reduziriam à passividade e ao egoísmo. Orwell temia que a
verdade fosse escondida de nós. Huxley temia que a verdade fosse submersa em um
mar de irrelevância. Orwell temia que nos tornássemos uma cultura enclausurada.
Huxley temia que nos tornássemos uma cultura insignificante, preocupada com
mecanismos escapistas****. Como Huxley observou em Regresso ao Admirável Mundo Novo, os defensores da liberdade civil
e os racionalistas que estão sempre em estado de alerta para se oporem à
tirania “falharam em levar em conta o apetite quase infinito do homem por
distração”. Em 1984, Huxley
acrescentou, pessoas são controladas por uma dor imposta. Em Admirável mundo novo, elas são
controladas por um prazer imposto. Em suma, Orwell temia que aquilo que odiamos
nos destruiria. Huxley temia que aquilo que amamos nos destruiria.
Este livro é sobre a possibilidade de que Huxley, e
não Orwell, estava certo.
O
livro é altamente recomendável para quem curte qualquer forma de estudo sobre
literatura, em especial aquela chamada de distópica*****, além de estudos sobre
sociedade, comunicação, cultura e pós-modernidade.