segunda-feira, 31 de agosto de 2009

LIBERDADE PARA AS BORBOLETAS (Butterflies Are Free - EUA; 1972)


Direção: Milton Katselas


Em determinado momento de Liberdade para as Borboletas, a mãe de Don Baker pergunta a Jill por quanto tempo ela esteve casada, ao passo que a jovem responde: “Seis dias”. A reação não muito espantosa da Sra. Baker se resume na fala que define a resposta que recebera: “E no sétimo dia você descansou?”. A referência bíblica não só faz parte de uma série de falas muito bem construídas que são colocadas de forma eficaz no roteiro adaptado da peça de Leonard Gershe (ele assina a versão cinematográfica também) como revela o peso moral que a personagem materna representa no desenvolvimento narrativo.
Claramente baseado no velho ditado que diz: “o amor é cego”, Liberdade para as Borboletas narra a história de um jovem rapaz deficiente visual (Don Baker) o qual sai de casa na esperança de conseguir viver por conta própria e acaba conhecendo e se relacionando pela recém-chegada vizinha (Jill). Don sai de casa para se afastar do modelo superprotetor de sua mãe – escritora de livros infantis e que usa a figura do próprio filho para criar um personagem cego com poderes que o ajudam a salvar a América de alienígenas e comunistas – mas, mesmo longe, não consegue fugir da influência materna que busca se fazer presente a todo tempo.
O personagem interpretado por Edward Albert se mostra extremamente organizado e forte com relação a sua deficiência, demonstrando – em muitos momentos – bom humor com relação à cegueira e outras deficiências (como na cena em que Ralph fala gritando com ele, mesmo sabendo que o rapaz não é surdo). A chegada de Jill (interpretada pela sempre divertida Goldie Hawn) causa um choque nessa vida organizada por trazer à tona velhas lembranças amorosas de Don e, por que não dizer, da própria Jill. Os dois jovens começam a manter uma relação extremamente forte – tudo num espaço de 24 horas até que a inesperada visita de Sra. Baker (Oscar de melhor atriz coadjuvante para Eileen Heckart) os coloca contra a parede num jogo de palavras que se desenvolve maravilhosamente ao longo da ação dramática.
A figura dos jovens apaixonados surge como representação do impulso sexual e da imaturidade que necessita de uma voz racional e moralista – muitas vezes forte e castradora – representada pela figura da Sra. Baker, a qual nunca deve ser encarada como vilã e, sim, como mãe preocupada cujas ações, por mais que sejam radicais, são guiadas pelo seu amor materno. A ela cabe a incumbência de abrir os olhos dos dois jovens, demonstrando ao filho que, apesar de se apresentar forte o suficiente para lidar com os obstáculos físicos que o cercam, ainda existem obstáculos sentimentais os quais ninguém é capaz de enxergar se não os vivenciar e encarar – elementos que formam uma das mais belas seqüências do filme. Além disso, demonstra à Jill que, embora tenha se relacionado com vários homens e até mesmo se casado e se divorciado com menos de vinte anos, tais ações se deram por imaturidade (quem sabe até pela falta que a figura paterna possui em sua vida).
Do ponto de vista técnico, interessante ressaltar que, apesar de ser uma narrativa que se desenvolve, basicamente, em um único ambiente, a iluminação cênica e a decupagem realizada pelo diretor Milton Katselas proporcionam, em vários momentos, belos planos (em especial aquele em que a Sra. Baker abraça seu filho, enquanto ele está sentado em um banco). Simples e eficaz, sensível, bem-humorado e poético – belo filme que (apesar de seus quase quarenta anos) continua atual em sua temática, a liberdade proporcionada pelo amor. E termino este texto contrapondo à temática da narrativa, uma fala da personagem Jill que é posta à prova ao longo do filme; ela diz que não quer se apaixonar, pois tal fato limita muito as pessoas e o que ela deseja é ser livre como as borboletas. Irônico o que a vida é capaz de nos revelar.