quarta-feira, 6 de abril de 2011

DENTES CANINOS (Kynodontas – Grécia, 2009)

Direção: Yorgos Lanthimos

            Vencedor da mostra Un Certain Regard do Festival de Cannes, esta produção grega conquistou uma indicação ao Oscar de filme estrangeiro neste ano apesar de possuir uma estrutura narrativa bem diferente daquela apreciada pelos membros da Academia. Dentes Caninos, ou em sua tradução em inglês Dogtooth, é um filme difícil de ser apreciado ou entendido por conta de sua diegese pouco convencional. A princípio é complicado entender o que se passa dentro daquela casa com aqueles personagens. Uma série de informações estranhas – que beiram o surreal – começam a ser apresentadas sem grandes explicações e leva tempo até o espectador se convencer de que é isso mesmo que está testemunhando: “zumbi” é uma pequena flor amarela e “xoxota” não passa de um tipo de lâmpada – pelo menos no universo desses personagens.
            A premissa da narrativa parte de um casal que mantém seus três filhos aprisionados em sua propriedade, onde são educados e de onde não podem sair antes que um de seus dentes caninos venha a cair – fato que, a idade desses jovens só vem a comprovar, nunca acontecerá. A única pessoa que pode ir além dos altos muros que cercam a residência é o patriarca da família, algo que só faz sob a proteção de seu automóvel. Já a única pessoa de fora que tem permissão para adentrar a casa é Christina, única personagem dotada de nome e cuja incumbência não vai além de satisfazer os desejos sexuais do único filho homem do casal.
            Com planos pouco convencionais, que, em muitos momentos, cortam a cabeça dos personagens em cena – talvez numa referência à falta de identidade própria que esses jovens possuem – Dentes Caninos acaba por representar uma metáfora menos convencional ainda da super proteção que os pais aplicam a seus filhos nos dias atuais. Esses jovens são totalmente condicionados pelos pais como animais, mais especificamente como cães domesticados. Em vários momentos, eles são obrigados a competirem entre si e diante de uma ameaça invisível – responsável pela morte de um personagem mais invisível ainda – os membros dessa família são obrigados a latirem como cães assustando gatos. Uma das cenas mais interessantes desse longa ocorre quando o pai resolve visitar o cachorro que colocou em treinamento e ao chamá-lo – Rex! – não é nem de perto atendido pelo animal de estimação, enquanto os filhos possuem uma forma curiosa de demonstrarem carinho entre si: lambendo uns aos outros. Recheado com algumas cenas chocantes – em especial na forma como esses pais reprimem certas ações dos filhos – Dentes Caninos aponta para a necessidade de liberdade e de contato com o mundo que os filhos devem ter durante seu desenvolvimento a fim de não serem apenas massa de manobra (ou animais domésticos) de uma sociedade cada vez mais selvagem ou de poderem manifestar suas vontades com racionalidade e não apenas com instinto de sobrevivência.
            Sem dúvida nenhuma chamar essa película de bizarra é algo bem aceitável, tendo em vista toda a sua estrutura, mas é impossível ficar indiferente com relação a ela. Dentes Caninos é um filme do tipo ame-o ou deixe-o, entretanto as discussões que podem se manifestar a partir do seu testemunho são bem interessantes e de extrema necessidade e, apesar de ser uma diegese que não me agrada por completo, devo garantir que me sinto muito satisfeito de poder ter o prazer de discuti-la a fundo – algo que só os bons filmes são capazes de me despertar.

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