Direção: Guillermo Del Toro
Se em filmes como O Pequeno Nicolau a inocência infantil é capaz de deturpar o universo dos adultos, em histórias como a apresentada em A Espinha do Diabo ocorre justamente o contrário. O universo adulto, muitas vezes cercado de conflitos armados e interesses ideológicos, acabam por cercear as manifestações de caráter infantil em um determinismo extremamente cruel. Interessante notar que, apesar de o cineasta mexicano Guillermo Del Toro ambientar seus mais famosos filmes nessas condições, a infância, em suas narrativas, ainda resiste às mutilações a que é exposta como que em uma experiência de sobrevivência. Assim como O Labirinto do Fauno, sua obra mais bem sucedida, A Espinha do Diabo transcorre no período da guerra civil espanhola. Em um orfanato situado no meio do nada, um grupo de rapazes é mantido por Carmen e pelo Dr. Casares. Muito mais que simples administradores do local, os dois auxiliam a guerrilha que luta contra o governo espanhol, mantendo os filhos dos guerrilheiros sob sua tutela e escondendo o ouro que sustenta a luta armada. Entretanto o ambiente parece cercado de paranormalidade, já que os próprios internos reclamam da presença de um fantasma – situação que parece se agravar com a chegada de Carlos, o mais novo interno do local.
Logo que chega, Carlos passa a ser perseguido por uma entidade fantasmagórica, uma criança esguia que exala sangue por uma ferida na cabeça – aliás, um detalhe realmente assustador em sua imagem. Com o tempo, Carlos começa a descobrir que essa assombração pode se tratar de um antigo interno desaparecido chamado Santi e que o sumiço do rapaz esconde mais informações do que poderia saber e que envolvem outros habitantes do orfanato. Embalados por uma bela trilha sonora, a poesia visual de Del Toro é completada por uma eficiente direção de arte – adoro o quarto dos internos – e uma fotografia estonteante. Interessante notar como os adultos, embora pareçam de pouca importância a princípio, possuem na dinâmica que realizam entre si a responsabilidade de definir o futuro dessas crianças. Essa questão surge como ponto fundamental da crítica à guerra e suas conseqüências nas gerações mais novas e, não obstante o conflito não se fazer presente por quase toda a narrativa, a simbologia da guerra está sempre diante dos nossos olhos, representado pela bomba cravada no chão do pátio – praticamente um monumento à destruição.
Nota-se, também, como, mesmo imersos a essa realidade, as crianças demonstram total afeto umas pelas outras e, da mesma forma, para com Carmen e Casares – mesmo que enfrentem conflitos naturais da idade como aqueles vivenciados por Carlos e Jaime. Apesar de não expressar os toques de genialidade testemunhados em O Labirinto do Fauno, A Espinha do Diabo aparece, hoje, como uma correta preparação para o filme que viria cinco anos depois. Del Toro prova sua competência como cineasta, ajudando o cinema mexicano – de excelência incontestável – a fugir dos estereótipos impostos à produção audiovisual do país pelas novelas que de lá importamos.
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