Direção: César Charlone e Enrique Fernández
César Charlone é um grande conhecido do cinema brasileiro. É ele quem assina a premiadíssima fotografia de Cidade de Deus com a qual conseguiu, inclusive, uma das quatro indicações ao Oscar que o filme nacional recebeu no ano de 2004. Uruguaio de nascença, Charlone aventurou-se pela primeira vez na direção cinematográfica nessa pequena obra-prima intitulada O Banheiro do Papa, contando com o auxílio de Enrique Fernández nesse trabalho. Os dois também assinam o roteiro da película o qual surge como o ponto alto dessa narrativa audiovisual cuja temática abrange questões bem atuais e, também, bem universais.
Um pequeno vilarejo uruguaio próximo à fronteira com o Brasil está em polvorosa com a proximidade da visita do papa João Paulo II ao lugar. O evento é encarado como histórico para a região e abre a possibilidade da cidadezinha receber milhares de turistas vindos de terras brasileiras – o que será explorado pelos habitantes do local como fonte de renda para a população. A ideia é que, com a chegada dos fiéis do país vizinho, ocorra grande procura por alimentos e, assim, os moradores resolvem usar seus dotes culinários para vender os mais variados tipos de comida. Para Beto, entretanto, o plano segue outro caminho. Sabendo que, com tantos alimentos sendo servidos, os turistas precisarão realizar suas necessidades fisiológicas, ele decide construir um banheiro para utilizar como serviço higiênico aos visitantes. A questão é que existe a necessidade de adquirir dinheiro para a obra e esse se torna o grande desafio dele.
A construção do personagem protagonista, Beto, é de forte sensibilidade. A atuação de César Trancoso nunca se torna exagerada, possibilitando momentos de angústia e humor de forma natural. Aliás, todo o desenvolvimento da ação dramática transcorre de forma natural – o que faz com que os questionamentos sejam apresentados de forma sutil, porém eficiente. Interessante notar como uma pequena cidade, cuja principal fonte de renda é proveniente do contrabando de produtos brasileiros, coloque suas esperanças em uma visita de um dia do papa em seu território. Mais interessante é o fato dessa esperança ser produto de uma especulação midiática em torno do número de brasileiros que se espera durante a visita de Sua Santidade. A questão da mídia é muito bem colocada na narrativa e, sempre suscitada por Silvia – filha de Beto – cujo sonho maior é trabalhar como jornalista e, dessa forma, torna-se elemento motivador para seus pais juntarem dinheiro, já que o curso que pretende realizar é dispendioso.
Criticando o velho discurso de que grandes eventos são capazes de transformar para melhor os lugares onde são sediados, O Banheiro do Papa, surge como um alerta social, abrindo os olhos do espectador para uma questão simples: não adianta basear as melhorias sociais em um evento singular, mas em um conjunto de ações contínuas – algo muito bem explorado por um conjunto de imagens que surgem em uma sequência no ato final do filme. E se a primeira vista, a narrativa parece caminhar para o melodrama, um dos grandes feitos do roteiro é proporcionar momentos bem humorados na trama. Seria muito bom que, em época de preparação para Copa do Mundo e Olimpíadas, os líderes políticos brasileiros se permitissem assistir a essa bela obra do cinema latino-americano. Mas será que haveria sensibilidade para isso? Temos uma longa década para nos certificarmos disso.
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