sábado, 7 de março de 2009

MOULIN ROUGE! – AMOR EM VERMELHO (Moulin Rouge!; EUA – 2001)


Direção: Baz Luhrmann

Seria uma grande injustiça manter este blog funcionando sem ter prestado homenagem a um de meus diretores favoritos. Algumas resenhas depois, senti que chegara a hora de discutir um dos trabalhos do diretor australiano Baz Luhrmann – e dentre eles, optei pelo mais famoso e, provavelmente, o que melhor faz jus a sua estética histriônica pop. Quase uma década após sua investida nos concursos de dança em Vem Dançar Comigo e cinco anos depois de modernizar Romeu + Julieta, Luhrmann se arriscou em um projeto bem audacioso: narrar a história de um jovem poeta inglês que se apaixona por uma cortesã francesa. Entretanto, a sua audácia não está em sua temática, uma vez que, de uma forma ou de outra, o amor é central em todos os seus projetos. A estilística utilizada para o desenvolvimento da narrativa é que chama atenção.

A primeira imagem que surge na tela é a de um palco cujas cortinas se abrem nos apresentando a já tão conhecida fanfarra da FOX. Interessante a forma como a imagem da empresa é intimamente ligada à narrativa e como Luhrmann optou por deixar claro, desde o primeiro instante, que estamos diante de uma história bem teatral. Pois bem! O título do filme, por se referir ao famoso cabaré francês, já poderia nos indicar uma certa teatralidade – afinal não podemos negar que as dançarinas (vulgo prostitutas) exercem papéis em sua profissão que remetem claramente ao teatro; em outras palavras, por que não aceitar o cabaré como uma forma de teatro? – assim sendo, só de ler as cartelas iniciais da película, já temos noção de ambiente e da estética da narrativa. Narrativa que, inclusive, se faz clara logo na primeira fala: “There was a boy” (Havia um menino), ou se preferir: era uma vez (“Once upon a time”). Interessante frisar o foco narrativo de Moulin Rouge!: um narrador conta, em terceira pessoa, a história que é contada pelo personagem principal em primeira pessoa (o boca-a-boca que Walter Benjamin caracterizava nas boas narrações).

A história se passa em Paris na virada dos séculos XIX e XX – um momento historicamente propício para revoluções nos âmbitos político, social e cultural. Christian é um jovem inglês que busca, na boemia francesa, a inspiração para seu imenso desejo de escrever sobre o amor. O fato de nunca ter amado alguém se torna um obstáculo, mas, logo que chega a Paris, acaba conhecendo um grupo de artistas cujas inclinações ideológicas vão ao encontro das dele. A relação do grupo com Chris inicia-se com uma bela junção de The Sound of Music (tema do musical A Noviça Rebelde) e Children of the Revolution (um hino da juventude revolucionária) em um número musical que inclui um símbolo do espírito revolucionário da época – o absinto (bebida que chegava ao teor alcoólico de 80%) – e um símbolo da cultura pop dos dias atuais – a cantora Kylie Minogue no papel da fada verde (apelido carinhoso da bebida). Isso tudo antes de entrarmos no cabaré que dá título ao filme. Aliás, o ritmo frenético é algo que acompanha a estrutura narrativa de Moulin Rouge!.

Ao chegarmos ao ambiente principal, o frenesi continua com a aparição sempre maravilhosa do ator Jim Broadment que dá vida a Harold Zidler, o dono do cabaré. Sua atuação é sensacional e, juntamente com John Leguizamo (que interpreta um dos artistas revolucionários, Toulousse-Lautrec) aparece como a ponta do iceberg de um elenco que realiza um trabalho muito correto. E, se pouco menciono o nome do casal protagonista (Ewan Mcgregor e Nicole Kidman) é porque suas atuações, de certa forma se apagam no conjunto. E já que falamos de aspectos técnicos, falemos sobre o que Moulin Rouge! tem de melhor: cenografia, figurino e maquiagem. As cores saltam aos olhos – um verdadeiro evento visual – conseguindo mesclar o contraste do colorido com o vermelho (cor predominante na película e presente no péssimo subtítulo que o filme recebeu nos cinemas brasileiros). Quanto à montagem, Luhrmann optou por uma estética que remete a uma das revoluções da linguagem audiovisual pop, o videoclipe, através de cortes rápidos (reparem como Zidler apresenta o cabaré olhando diretamente para o espectador como se fosse um ícone da MTV cantando em seu mais novo videoclipe). Além disso, a cultura pop está presente em números musicais pouco convencionais que incluem Nirvana, Queen e Madonna.

Voltando a narrativa. A história de Moulin Rouge! é extremamente romântica (não em sua temática, mas na forma como é desenvolvida, uma vez que remte ao estilo de época conhecido como Romantismo). Temos dois personagens que se apaixonam imediatamente, mas que sofrem com os mais diversos obstáculos para que possam desfrutar do amor que sentem um pelo outro. O olhar que Chris oferece a Satine desde o primeiro momento em que a vê, deixa clara sua paixão à primeira vista, enquanto que a cortesã se sente fisgada pelo amor logo que ouve uma das poesias do rapaz. Como qualquer obra romântica, Luhrmann não abriu mão do maniqueísmo representado pela bipolaridade Chris (o homem honrado, honesto e corajoso) e o duque (maquiavélico e invejoso). O duque surge na história como um investidor que irá financiar a vida artística de Satine em troca – é claro – de seus serviços sexuais. Típico feuilleton. E como de costume o romance envolvendo uma cortesã não é a mais aceita das relações – principalmente pela burguesia conservadora daquela época. Dessa forma, o final desse romance já é previsível (só lembrarmos do ícone do romantismo brasileiro José de Alencar e uma de suas obras mais famosas: Lucíola).

Vencedor de dois prêmios da academia, Moulin Rouge! conseguiu a façanha de ressuscitar um gênero cinematográfico que andava esquecido em Hollywood: o musical. Baz Luhrmann, apesar de nem ter sido indicado ao Oscar, conseguiu realizar seu projeto mais audacioso, permeando – sem ser enfadonho – sua estética camp, não é preciso ser melodramático para se fazer um melodrama (essa é a grande lição que este projeto nos deixa).

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