Auguste e Louis Lumière |
Afirmar
que o cinema surgiu com o cinematógrafo dos irmãos Lumière é algo
extremamente questionável. Basta uma pequena pesquisa para
percebermos que o registro de movimento, presente na própria
etimologia da palavra que deu nome ao dispositivo (a palavra
cinematógrafo remonta da junção dos termos kinéma –
movimento e graphos – registro, significando registro do
movimento; o termo cinema nada mais é que a abreviação da
palavra cinematógrafo), muito além de ser um desejo antigo,
já era realidade quando, em 28 de dezembro de 1895, Auguste e Louis
Lumière (foto acima) fizeram a primeira exibição de imagens
em movimento. Em países como EUA e Alemanha, outros dispositivos
eram utilizados na promoção de projeções públicas de cinema,
dentre as quais algumas já pagas. Portanto, o marco inicial – a
data de nascimento da Sétima Arte – é meramente simbólico e
tentar entender as razões pelas quais o Grand-Café de Paris é
considerado como o início do cinema seria um tema para várias
pesquisas. O que vale ressaltar, no entanto, é que o cinematógrafo
é mais uma das inúmeras tentativas de registro do movimento, os
quais, ao longo da história, intervieram no imaginário do homem. O
objetivo deste pequeno artigo é explorar um pouco dessa história no
intuito de mostrar que, assim como afirma Arlindo Machado (in COSTA,
2005, p.13), “o cinema (...) é um meio ainda a ser descoberto”.
Animal locomotion - 16 frames of racehorse "Annie G." galloping |
Entender
o cinema em sua origem é desembocar no desenvolvimento de várias
técnicas e pesquisas de cunho científico, todas possibilitando a
emergência daquilo que hoje consideramos cinema. A câmara escura,
por exemplo, forneceu experiências inovadoras no sentido da produção
de perspectiva e, também, nas pesquisas de movimento cujo principal
nome é o de Eadweard J. Muybridge. Sua curiosa tentativa de provar
que um cavalo, a galope, permanecia com as quatro patas no ar ao
mesmo tempo motivou a elaboração de um dispositivo que, ao ser
acionado, disparava – tal qual uma metralhadora – uma sequência
quase instantânea de fotos que registravam o desenrolar dos
movimentos do animal. As pesquisas envolvendo a persistência
retiniana, também, foram fundamentais, pois provaram que a retina é
incapaz de registrar determinada imagem caso ela seja apresentada a
certa velocidade. O princípio da ilusão cinematográfica está
baseado justamente nessas pesquisas: fotografias em sequência
exibidas a uma certa velocidade, dando a impressão de movimento,
pois nossa retina é incapaz de registrar o intervalo que existe
entre os fotogramas.
A
essa altura da história, entretanto, muitas outras formas de
intervenção no imaginário, através do uso da simulação do
movimento, eram fartamente utilizadas em feiras e outras exibições.
Uma das mais populares eram as lanternas mágicas, cujo conceito
muito lembra o projetor de cinema. As fantasmagorias eram um dos usos
mais comuns do princípio da lanterna mágica, abrindo espaço para
um conceito de espetáculo realizado a partir da projeção de
imagens. Outro dispositivo muito difundido na época eram os
panoramas: pinturas desenvolvidas em 360°, dispostas em forma
circular que ofereciam ao espectador a sensação de real. Nessas
pinturas eram representadas cenas de batalhas, pontos turísticos,
vistas de elementos naturais como montanhas e mares de tal forma que
aquele que observava as imagens sentia-se parte da cena retratada.
Além disso, já nos EUA, fazia sucesso um aparelho denominado
cinetoscópio. Desenvolvido no laboratório de
Thomas Edison, esse dispositivo possibilitava a projeção individual
de imagens animadas. Interessante notar que todos esses dispositivos
eram explorados comercialmente, algo que marcará o cinema ao longo
de sua história. Entretanto, podemos afirmar que o imaginário é um
dos, senão o maior, atrativo dessas novas formas de tecnologia –
algo que remete a períodos muito mais antigos que o século XIX.
Cinetoscópio |
Hoje
se sabe que, desde a pré-história, já se buscava registrar, em
imagens, o movimento. Pinturas rupestres exploravam o relevo, as
luzes e as sombras para simularem o efeito de animação. O próprio
mito concebido por Platão antecipa – em forma de alegoria – o
princípio das salas cinematográficas, através do conceito de
projeção, nas paredes da caverna que dá título ao mito, de
sombras que simulam o real. O cinema, tal qual conhecemos hoje em
dia, desenvolveu-se ao longo de anos – séculos – e os irmãos
Lumière, percebe-se, foram apenas um passo importante desse
desenvolvimento, o qual merece muito mais atenção que a que
oferecemos, uma vez que os estudos envolvendo esse período ainda são
escassos.
O
advento do cinematógrafo abriu espaço para um período da
historiografia do cinema conhecido por terminologias como: cinema das
origens, cinema de atração, cinema de mostração, pré-cinema,
dentre outros. Esse período vem se revelando como um momento rico
para o estudo do audiovisual e da linguagem cinematográfica anterior
à Narração Clássica e, também, merece atenção especial dos
amantes da Sétima Arte.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:
COSTA,
Flávia Cesarino. O Primeiro Cinema. Espetáculo, narrativa,
domesticação. Azougue Editorial: Rio de Janeiro, 2005.
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