quinta-feira, 15 de março de 2018

DAS ORIGENS DO CINEMA AO CINEMA DAS ORIGENS

Auguste e Louis Lumière
Afirmar que o cinema surgiu com o cinematógrafo dos irmãos Lumière é algo extremamente questionável. Basta uma pequena pesquisa para percebermos que o registro de movimento, presente na própria etimologia da palavra que deu nome ao dispositivo (a palavra cinematógrafo remonta da junção dos termos kinéma – movimento e graphos – registro, significando registro do movimento; o termo cinema nada mais é que a abreviação da palavra cinematógrafo), muito além de ser um desejo antigo, já era realidade quando, em 28 de dezembro de 1895, Auguste e Louis Lumière (foto acima) fizeram a primeira exibição de imagens em movimento. Em países como EUA e Alemanha, outros dispositivos eram utilizados na promoção de projeções públicas de cinema, dentre as quais algumas já pagas. Portanto, o marco inicial – a data de nascimento da Sétima Arte – é meramente simbólico e tentar entender as razões pelas quais o Grand-Café de Paris é considerado como o início do cinema seria um tema para várias pesquisas. O que vale ressaltar, no entanto, é que o cinematógrafo é mais uma das inúmeras tentativas de registro do movimento, os quais, ao longo da história, intervieram no imaginário do homem. O objetivo deste pequeno artigo é explorar um pouco dessa história no intuito de mostrar que, assim como afirma Arlindo Machado (in COSTA, 2005, p.13), “o cinema (...) é um meio ainda a ser descoberto”.

Animal locomotion - 16 frames of racehorse "Annie G." galloping

Entender o cinema em sua origem é desembocar no desenvolvimento de várias técnicas e pesquisas de cunho científico, todas possibilitando a emergência daquilo que hoje consideramos cinema. A câmara escura, por exemplo, forneceu experiências inovadoras no sentido da produção de perspectiva e, também, nas pesquisas de movimento cujo principal nome é o de Eadweard J. Muybridge. Sua curiosa tentativa de provar que um cavalo, a galope, permanecia com as quatro patas no ar ao mesmo tempo motivou a elaboração de um dispositivo que, ao ser acionado, disparava – tal qual uma metralhadora – uma sequência quase instantânea de fotos que registravam o desenrolar dos movimentos do animal. As pesquisas envolvendo a persistência retiniana, também, foram fundamentais, pois provaram que a retina é incapaz de registrar determinada imagem caso ela seja apresentada a certa velocidade. O princípio da ilusão cinematográfica está baseado justamente nessas pesquisas: fotografias em sequência exibidas a uma certa velocidade, dando a impressão de movimento, pois nossa retina é incapaz de registrar o intervalo que existe entre os fotogramas.
A essa altura da história, entretanto, muitas outras formas de intervenção no imaginário, através do uso da simulação do movimento, eram fartamente utilizadas em feiras e outras exibições. Uma das mais populares eram as lanternas mágicas, cujo conceito muito lembra o projetor de cinema. As fantasmagorias eram um dos usos mais comuns do princípio da lanterna mágica, abrindo espaço para um conceito de espetáculo realizado a partir da projeção de imagens. Outro dispositivo muito difundido na época eram os panoramas: pinturas desenvolvidas em 360°, dispostas em forma circular que ofereciam ao espectador a sensação de real. Nessas pinturas eram representadas cenas de batalhas, pontos turísticos, vistas de elementos naturais como montanhas e mares de tal forma que aquele que observava as imagens sentia-se parte da cena retratada. Além disso, já nos EUA, fazia sucesso um aparelho denominado cinetoscópio. Desenvolvido no laboratório de Thomas Edison, esse dispositivo possibilitava a projeção individual de imagens animadas. Interessante notar que todos esses dispositivos eram explorados comercialmente, algo que marcará o cinema ao longo de sua história. Entretanto, podemos afirmar que o imaginário é um dos, senão o maior, atrativo dessas novas formas de tecnologia – algo que remete a períodos muito mais antigos que o século XIX.
Cinetoscópio
Hoje se sabe que, desde a pré-história, já se buscava registrar, em imagens, o movimento. Pinturas rupestres exploravam o relevo, as luzes e as sombras para simularem o efeito de animação. O próprio mito concebido por Platão antecipa – em forma de alegoria – o princípio das salas cinematográficas, através do conceito de projeção, nas paredes da caverna que dá título ao mito, de sombras que simulam o real. O cinema, tal qual conhecemos hoje em dia, desenvolveu-se ao longo de anos – séculos – e os irmãos Lumière, percebe-se, foram apenas um passo importante desse desenvolvimento, o qual merece muito mais atenção que a que oferecemos, uma vez que os estudos envolvendo esse período ainda são escassos.
O advento do cinematógrafo abriu espaço para um período da historiografia do cinema conhecido por terminologias como: cinema das origens, cinema de atração, cinema de mostração, pré-cinema, dentre outros. Esse período vem se revelando como um momento rico para o estudo do audiovisual e da linguagem cinematográfica anterior à Narração Clássica e, também, merece atenção especial dos amantes da Sétima Arte.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

COSTA, Flávia Cesarino. O Primeiro Cinema. Espetáculo, narrativa, domesticação. Azougue Editorial: Rio de Janeiro, 2005.

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