segunda-feira, 6 de julho de 2009

DEZ MINUTOS EM VISTA ALEGRE

- Dezessete anos... Você...
Dezessete anos e um pacto de vida concedido por Deus é rompido pelo estalo seco do revólver – manchado de sangue.

Pablo amanheceu diferente naquela manhã – tinha um sorriso maroto no rosto; típico da idade. Em seus poucos dezessete anos, havia experimentado muitas coisas incomuns a sua época, mas, naquele dia específico, provou a sensação de se tornar homem. Deitado ao lado da mulher que o trouxera à maturidade, orgulhava-se de ter levado ao orgasmo uma senhora casada, dezenove anos mais velha. Nem sabia direito o que era aquilo, apenas deixou que ela agisse, confiando em seus toques e movimentos. Já tinha um bom conselho para seus futuros filhos e netos.
Já tinham passado cinqüenta minutos das sete horas e Camila despertava nos braços de um passivo rapaz, que, segundo suas próprias palavras, descobrira o que era a vida momentos antes. Ela, casada, mãe de um filho caiu atraída pela precocidade do primo de seu vizinho e ignorou tanto o casamento de dez anos quanto a prole de quatro.
Nesse instante, ouviu-se o barulho da porta e os passos pesados de um saudoso marido. A sensação de sonolência sumiu rapidamente e um olhar desesperado encontrou o jovem olhar perdido de Pablo. Ele, desentendido, ouviu as palavras desencontradas de Camila e desnorteado assistiu a entrada triunfal do enganado seguida das lágrimas de raiva e da sede de vingança. Tentou levantar-se, hesitou – ainda estava sem roupas -; ouvia as tentativas de explicação da esposa infiel. Pablo busca a saída com olhares e se imaginava longe dali – onde fora se meter... Daí veio a primeira pancada – no rosto. Foi agarrado e puxado. Camila tentou segurá-lo também, mas a força do marido traído foi maior, tamanha a raiva. Contra a parede, nu, Pablo se deu conta de que estava sob a mira de um revólver – sob a mira de um homem irado.
- Acha bonito ir para a cama com a mulher dos outros? – começava a contagem regressiva.
Camila, em prantos, dividia-se entre implorar pela vida de Pablo e tentar entender o que havia saído errado em sua pulada de cerca. O marido chegou muito de repente, mal sabia ela de onde. Ele havia viajado? Estava no trabalho? Trabalhava a noite... Quem sabe? Talvez estivesse com outra mulher e esse fosse o motivo para sua traição – vingança... Não conseguia seguir uma linha de raciocínio lógica. Lembrava que trouxera Pablo consigo até seu apartamento. Chegaram tarde – passavam das duas da manhã. O pequeno Matheus acordou sossegado pelos carinhos da mãe e foi levado para sala onde conheceu um novo amigo. Pablo sentiu-se na necessidade de confortar o menino que ria, ainda que sonolento, de suas palhaçadas juvenis. Logo depois, a criança foi levada para a casa do vizinho – o primo era cúmplice da primeira noite do pequeno Pablo. Ela apertou os olhos e voltou à realidade. O marido dava tapas no pobre rapaz.
Pablo, sem palavras, deixava a mão pesada de seu futuro algoz alcançar seu rosto com raiva. Doía na face, doía na consciência. As lágrimas caíam em seu rosto – voltava a ser uma criança imatura. Camila mentiu... Ainda havia muita coisa a ser descoberta na vida. Queria apenas que aquela noite fosse perfeita e, de fato, foi. No momento mais esperado, cresceu – não podia se apresentar como uma criança, apesar do nervosismo impedir; ela gostou. E, disso, ele se orgulhava. Quantos podiam contar a história que ele poderia a partir daquele dia. Não podia. Tinha convicção de que não sairia vivo dali e chorava por isso.
- Quantos anos?
- Dezessete, Paulo. Pelo amor de deus...
- Não falei com você...
Então esse era o nome dele. Finalmente havia sido apresentado ao amante de sua esposa. Talvez ele já soubesse seu nome, deviam ter rido durante toda a noite: “aquele corno”. Paulo não tirava sua arma da cara daquele ridículo bebê chorão. Só não entendia o que havia acontecido de errado em seu casamento. Um garoto de dezessete anos na cama com sua esposa. E seu filho onde estaria? Olhou atentamente para sua vítima e percebeu que parara de bater nele. O rosto a sua frente estava bem avermelhado – pelas pancadas, pelo choro interminável. Seus sentimentos misturavam-se, não movia o revólver um centímetro sequer. Como aquele garoto pudera fazer isso? Olhou atentamente nos olhos do pequeno, esbanjava ódio:
- Dezessete anos... Você...
Dezessete anos e um pacto de vida concedido por Deus é rompido pelo estalo seco do revólver – manchado de sangue. Pablo, de olhos fechados, caiu encolhido no canto com a terrível sensação de ser encontrado nu pela perícia. Ele podia ao menos tê-lo deixado colocar as roupas – a morte seria mais digna:
- Foi sua primeira vez, não foi?
O jovem abriu os olhos e enxergou, de baixo para cima, Paulo a sua frente. Sobre a cama, o sangue de Camila manchava os lençóis e, na rua, já dava para ouvir as manifestações de espanto que acordou todo o quarteirão. Ainda espantado, ainda com lágrimas saindo dos olhos, Pablo acenou que sim:
- Some daqui antes que eu me arrependa do que eu fiz e eu sei que eu vou me arrepender.
Tremendo de medo, o pequeno Pablo pegou suas roupas e saiu – sem reação nenhuma. Sem reação quando viu Camila tirando o vestido; sem reação quando sentiu-se dominado por ela; sem reação quando o marido chegou; sem reação... Pecou, ejaculou, morreu, renasceu... Quantas experiências para os futuros filhos e netos.
Do lado de fora, muitas pessoas se aglomeravam ao redor do prédio – não conseguiu olhar ninguém. Apenas caminhava sem redirecionar os olhos para lado algum. A sua frente, o comércio despertava para mais um dia de trabalho – eram oito da manhã e Pablo já havia visitado o céu e o inferno, duas vezes.

MARIO CHRIS

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